O Aeroclube Brasileiro e a Escola Brasileira de Aviação

Já mencionamos brevemente aqui a história do Aeroclube Brasileiro porém, vale relembrar e ressaltar pontos importantes para a formação de pilotos militares.

O primeiro voo no Brasil, de que se tem notícia, com avião produzido no país, teria sido realizado em 7 de janeiro de 1910, na cidade de Osasco, pelo industrial francês Dimitri Sensaud de Lavaud (1882-1947) – produtor de canalizações de barro – e pelo torneiro mecânico Lourenço Pellegati. Eles teriam voado um trecho de 100 metros, à altura de 4 metros, em 6,8 segundos. O avião, denominado São Paulo, mais tarde colocado em exposição no centro da capital paulista, foi vendido, e o comprador – um corajoso entusiasta da aviação – que logo em seguida, sofreu um acidente fatal com o aparelho.

Na mesma época, a aviação se desenvolvia na França, com a fabricação dos aviões Farman e Voisin e com as já famosas École d’Aviation Farman em Etamps, Oise, no norte do país, e a Blériot, localizada em Pau, no Sul. A Itália, a exemplo de outros países europeus, também iniciava as suas atividades aéreas usando aparelhos franceses. Orgulhosos dos feitos aeronáuticos dos seus compatriotas, especialmente nos céus da Líbia – onde o avião fora utilizado pela primeira vez em missões de guerra – representantes da colônia italiana trouxeram dois reconhecidos pilotos para fazer demonstrações no Brasil: Germano Ruggerone e Giulio Piccolo. Na véspera do Natal, numa tentativa de decolagem de uma pista de 100 metros de um velódromo de São Paulo, Piccolo sofreu um acidente com o seu Blériot, tornando-se o primeiro estrangeiro a sofrer acidente aeronáutico fatal no Brasil. Após algumas tentativas frustradas de voar no dia de Natal e no último dia do ano, talvez abalado pelo triste acidente com o amigo, Ruggerone conseguiria voar com o seu Farman somente no início do ano seguinte, 1911, sendo por muitos considerado o primeiro a voar com aviões no Brasil.

Depois de São Paulo, Ruggerone voaria também no Rio de Janeiro, fazendo grande sucesso e aumentando o entusiasmo pela aviação no país. Em tempo, a aviação era uma novidade que atraía muitos praticantes, especialmente entre as classes sociais mais abastadas, pois voar era um esporte caro. Esta peculiaridade, frequentemente, estava presente nas causas dos acidentes aeronáuticos, em virtude do elevado número de pilotos autodidatas ou com insuficiente preparo técnico.

No segundo semestre, chega ao Rio de Janeiro com o seu Blériot, o italiano Ernesto Dariolli. Na mesma época, proveniente de Nova York, desembarca no país a empresa de demonstrações aéreas Queen Aviation Company Limited. A Queen trazia, entre os seus contratados, alguns dos mais famosos pilotos franceses da época, entre eles Roland Garros e Charles Voisin. A finalidade da visita era participar da Semana da Aviação, o primeiro grande evento aviatório do Brasil, organizado pelo Major Paiva Meira, do Exército Brasileiro. O encontro estava marcado para ser inaugurado no dia 12 de janeiro de 1912.

Em São Paulo, Eduardo Pacheco Chaves, o segundo civil brasileiro a se brevetar na Escola de Blériot (o primeiro foi Santos Dumont), acompanhava com atenção os acontecimentos no Rio de Janeiro. Edu Chaves, como era conhecido, possuía uma escola de pilotagem em Guapira, com dois Blériots. Seria a sua escola que, em 17 de dezembro de 1913, serviria de base para a criação da Escola de Aviação da Força Pública de São Paulo. Auxiliado por Cícero Arsênio de Souza Marques, um reconhecido instrutor, eles formariam aviadores até o ano seguinte, 1914, quando, enfrentando os mesmos problemas do aeroclube e da Escola Brasileira de Aviação, no que se referia à aquisição de aeronaves e peças sobressalentes francesas, assistiriam ao prematuro encerramento da escola.

No Rio de Janeiro, a Semana Aviatória seguia a sua vibrante programação. A imprensa brasileira, entusiasmada com as exibições e revigorada em seu patriotismo com a invenção do conterrâneo Santos Dumont, amplificava o acontecimento que ocupava as manchetes dos jornais e servia de pivô para pressionar pela criação de uma organização que promovesse as atividades aéreas no Brasil. O aeroclube, que havia iniciado as suas instruções com somente um avião, tendo como instrutor o experiente piloto Ernesto Dariolli e uns poucos alunos, entre eles o Tenente do Exército Ricardo João Kirk, obtém verbas públicas para adquirir um aparelho “Blériot-Sit” na França. O Tenente Ricardo Kirk, que havia voado como passageiro de Roland Garros na Semana Aviatória, em julho de 1912, é encarregado da compra e autorizado a frequentar curso de piloto na École d’Aviation d’Étamps. A partida de Kirk para a Europa é registrada pelo jornal “A Noite”, na edição de 26 de julho de 1912, com uma matéria jornalística que buscava não só enaltecer o avanço que se dava no recém criado aeroclube, mas, principalmente, intimar o governo a se posicionar sobre a adoção dos aeroplanos nas forças militares do país.

A inauguração da Escola Brasileira de Aviação é marcada para o dia 2 de fevereiro de 1914, e, finalmente, ocorre numa bela e entusiástica cerimônia, com a presença do Ministro da Guerra.

Em alinhada formatura, se apresentavam os novos e reluzentes aviões da flotilha:

– 2 biplanos “Farman”, motor Gnome de 50 HP;

– 1 biplano “Farman”, motor Gnome de 80 HP;

– 1 monoplano “Aerotorpedo”, motor Suet de 80 HP;

– 4 monoplanos “Bleriot”, motor Anzani de 25 HP;

– 1 monoplano “Bleriot”, motor Anzani de 35 HP.

Na cerimônia, o Ministro faz a entrega oficial da relação dos 35 alunos matriculados para o curso; entretanto as apresentações dos novos alunos não são realizadas regularmente. Duas semanas após o início das atividades, muitos deles ainda não haviam se apresentado para as aulas. Os inscritos pela Marinha se apresentariam somente em abril, dois meses após ter sido inaugurada a escola. Foi designado como fiscal do governo junto à escola, o primeiro tenente da marinha Jorge Henrique Moller, primeiro oficial brasileiro brevetado para voar aviões. O seu brevet internacional, de número 486, foi concedido no dia 29 de abril de 1911, junto à Escola Farman, em Etamps, na França. Havia somente dois instrutores para o curso – Felice Gino e Ambrosio Caragiola – e este fator, somado à fragilidade dos aparelhos, atrasava e tornava irregular o ensino, particularmente as aulas práticas de voo.

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Em sete de fevereiro de 1915, Ambrósio Caragiola, que viera da Argentina para participar da implantação da Escola Brasileira de Aviação, também tem um fim trágico num acidente durante uma demonstração no antigo Campo do Derby Club – onde hoje se situa o Estádio do Maracanã –, com o primeiro avião construído no Brasil, o “Alvear”, construído por J. Alvear. Somente dois anos depois do fechamento da Escola Brasileira de Aviação, a Marinha retomaria as suas atividades aeronáuticas, ativando, em 1916, a sua Escola de Submersíveis e Aviação. O Exército e a Força Pública de São Paulo demorariam cinco anos para reiniciarem efetivamente as suas atividades aéreas e, em 1919, após o término da Primeira Guerra Mundial, começariam a formar aviadores.

Fonte: adaptado. História Geral da Aviação Brasileira, 1988

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